- Estou absolutamente farta disto, Jacob! – Gritei exasperada. – Não aguento mais! Não consigo!
Dei um pontapé com toda a minha força numa árvore que estava ao meu lado e ela tremeu ligeiramente. A primavera ia já bastante avançada mas o frio não cessava. Estava novamente a chover e ambos tínhamos o cabelo e as roupas encharcados. Ele aproximou-se de mim e agarrou-me. Era fácil perceber o que pensava mesmo quando não estávamos transformados. Queria que me acalmasse antes que me pudesse transformar porque sabia que isso faria tudo aquilo bem pior.
- Acalma-te Leah! Passares-te só vai fazer pior!
Sabia que estava a chorar porque tinha os olhos a arder e porque as lágrimas eram muito mais quentes que as gotas da chuva, mas duvidava que ele reparasse. Tentei fazer-me de forte e não começar a soluçar descontroladamente à frente dele.
- Já não me chegava ter de os ver todos amorosos à frente todos os dias agora também tenho de sentir o quanto ele a ama sempre que estamos transformados? – A minha voz era trémula mas não tanto como seria de esperar. – Não! Eu vou deixar a alcateia! Prefiro andar por aí sozinha, e assim não tenho de o ouvir! Por favor Jake, deixa-me ir!
Ele estava com o peito nu encostado às minhas costas e eu conseguia sentir o seu coração bater apressadamente. Resisti durante um bocado e fico algo orgulhosa de dizer que ele ficou bastante cansado do esforço que foi necessário para me manter no lugar. Quando acabei por finalmente acalmar e deixei de lutar contra o seu abraço olhei em minha volta. Estava exactamente no mesmo sítio onde ele tinha vindo falar comigo, onde me explicou a natureza da nossa tribo e que acabou com a minha vida.
***
-Leah, preciso de falar contigo… - Quando ouvi aquele tom soube de imediato no que aquilo haveria de acabar. E, bem, se não tivesse sido a reviravolta dos lobos eu teria conseguido prever cada uma das palavras que ele escolheu para quebrar o meu coração.
Ele aproximou-se calmamente de mim, algo que não fazia há já uns dias. Aproveitei para beijá-lo, algo que já não fazíamos à algum tempo (apenas mais um sinal de que algo estava terrivelmente mal), mas o beijo foi estranho. Desconfortável. Como se de repente os seus lábios tivessem mudado de forma e deixassem de pertencer aos meus. Como se agora estivessem moldados à imagem de outros lábios, uns lábios que se encaixariam perfeitamente nos seus. Uns lábios que não eram os meus.
- Claro amor, fala. – Encostei-me a ele e meti o braço à volta da sua cintura, esperando que ele rodeasse os meus ombros com o seu, mas quando isso não aconteceu e ele se afastou de mim fiquei de rastos.
- Talvez devêssemos dar uma volta pela floresta, pode ser?
Não lhe respondi, mas segui atrás dele até ao sítio onde tínhamos escrito os nomes um do outro numa árvore. Nada demasiado piroso com corações à volta. Apenas os nossos nomes. Cada um escreveu o nome do outro, mais nada. Sentou-se com as costas encostadas à árvore e segui-lhe o exemplo. O vento soprou na nossa direcção e eu arrepiei-me com o frio.
Imediatamente, ele despiu o casaco e passou-mo pelos ombros, ficando apenas de T-shirt.
- Assim vais morrer de frio! – Reclamei! – Estão 8 graus Celsius. És louco? – Disparei. – Eu já estou suficientemente agasalhada!
- Cala-te e veste mas é o casaco. – A sua voz arrepiou-me ainda mais. Não era odiosa nem ríspida, mas também não era doce, quente e suave como estava habituada. Era fria e insensível. – Eu fico bem, acredita.
Segui as instruções como um cachorrinho bem treinado e esperei que ele começasse a falar. Demorou alguns minutos mas eventualmente respirou fundo e falou.
- Sei que já ouviste falar das lendas da tribo. – Sim, já as conhecia como a palma da minha mão. Ele sabia que o meu pai e o meu avô me costumavam contar as lendas da tribo Quileute antes de me ir deitar. Ele sabia muito bem disso. – Bem, eu não sei como te deva dizer isto, mas todas essas lendas são reais.
Fiquei a olhar para ele com cara de parva a tentar descobrir se ele estava a gozar comigo ou esperava seriamente que eu acreditasse no que me estava a dizer. Porque muito sinceramente, a única pessoa que me tinha dito aquilo com tamanha convicção tinha sido o meu avô e era sabido que ele tinha sérios problemas com alucinações.
De repente comecei a rir-me.
- Meu Deus! – Disse por entre gargalhadas. – Eu… eu… eu achava que ias acabar comigo… - era difícil falar por entre tanto riso – … e afinal é só para me dizeres que te tens andado a drogar! – Finalmente consegui parar. – O que é que andas a tomar? Sabes que essas coisas são perigosas!
Ele continuava a olhar para mim com o olhar mais sério do mundo e com dor estampada nos seus olhos.
- Leah, não estou a dizer nenhuma piada. É a mais pura das verdades. – Quando não disse nada ele continuou. – Os vampiros existem realmente e a razão de ser da tribo é proteger os humanos desses monstros. – Continuei sem falar. Estava sem palavras. – E a história de nos transformarmos em lobos, é verdade. Os homens da nossa tribo, quando chegam a uma determinada idade, começam a sofrer alterações, até que se transformam.
Senti o meu queixo descair até ao chão.
- Só podes estar a gozar. – Suspirei. – Porque é que me estás a contar isso? – Perguntei.
- Por três razões. A primeira é que eu sou o primeiro da nossa geração a transformar-se, e que o Jacob, o Quil, o Paul, o Jared, e daqui a uns anos mesmo o Seth se transformará. – Continuei de boca aberta. – A segunda é que quero manter-te a salvo dos Cullen.
- Os Cullen? – Perguntei. – Eles? Vampiros?
- Sim, e eles não se podem aproximar da reserva, desde que te mantenhas longe do lado deles da floresta deves estar bem, mas quando estás em Forks tens de saber que é território neutro e embora eles não te possam fazer mal sem provocar uma guerra, deves manter-te o mais afastada quanto possível.
- E a terceira…?
- A terceira é a parte pela qual me vais odiar. – Ele respirou fundo.
- Porquê?
- Porque tive a minha impressão natural.
- Im…. Im… impressão natural? – Fiquei perplexa e ao aperceber-me do que isso queria dizer as lágrimas começaram a cair-me dos olhos. – Isso é… é… aquela coisa do amor à primeira vista não é? – As lágrimas caíam descontroladamente pelas minhas bochechas e eu detestava isso.
- É… - Olhei para ele. Não conseguia ver muito bem porque as lágrimas nos olhos me desfocavam a visão, mas conseguia ver o seu olhar de culpa enquanto me abraçava. – Desculpa, Leah. Lamento imenso…
- Quem é ela…? – Funguei.
- É… a Emily.
***
Aquela recordação foi o fim, já não aguentava mais e acabei por me transformar.
O Jake largou-me a tempo de não ficar ferido, mas ainda caiu de rabo no chão. Assim que me transformei voltei a sentir os cérebros fervilhantes dos outros membros da alcateia. O Paul começou logo a espicaçar.
“Então miúda, mais calma ou ainda a sofrer de SPM?”
“Vais te calar?” Rugi. Ele calou-se de imediato e aí mesmo reparei que os nomes ainda estavam gravados no tronco da árvore.
Rosnei e lancei as unhas à casca da árvore, despedaçando-a e deixando a seiva a escorrer pelo tronco abaixo.
Levei uns bons minutos a acalmar-me e quando finalmente voltei à minha forma humana o Jacob ficou a olhar para mim espantado. Só quando ele me olhou de alto a baixo é que me apercebi que estava ali em frente a ele. Completamente nua!
Apressei-me a esconder atrás da árvore mais próxima. Nunca deixava que os rapazes da alcateia me vissem assim. Era por isso que me transformava sempre bem longe deles.
Senti as bochechas a aquecer e percebi que estava a corar. “É só o que mais me faltava!” Pensei. Ele aproximou-se um pouco, muito lentamente, sem mudar o ângulo entre nós para que não visse nada que eu não quisesse que ele visse.
- Se é que isso serve de alguma coisa, és linda. Não precisas de te esconder, e acredito que daqui a pouco tempo vais encontrar alguém que te ama e vais esquecer o Sam por completo.
Afastei-me um pouco da árvore. Ele desviou o olhar. Não era a única que estava envergonhada. Ao menos isso.
- A sério?
- Claro, e daqui a uns tempos tens a tua impressão natural e nunca mais te vais lembrar disto! Vais ver que te vais rir destas coisas!
- Eu estava a falar de dizeres que eu era bonita…
- Oh! – Ele começou a gaguejar. – S…Sim! C…claro! És lindíssima!
Aproximei-me dele, peguei-lhe o queixo e dirigi os meus lábios aos dele. Eram quentes, suaves e húmidos. Fantásticos. Ele abraçou-me embora muito levemente, com medo do que o facto de eu estar totalmente despida tornasse o gesto impróprio.
Pouco tempo depois ele afastou-se.
- Desculpa, desculpa, lamento. Isto não está certo.
- Vamos fugir. Os dois. Formamos uma nova alcateia longe daqui! Eu esqueço o Sam e tu esqueces a Bella! E tu podes passar a ser o Alpha, como está destinado!
- Leah, neste momento, se estivermos separados da alcateia ficaremos em perigo! E eu amo a Bella e tenho hipóteses com ela! Ninguém pode saber o que aconteceu!
- Ela nunca te vai escolher Jacob! Ela ama o Edward! Nunca o vai deixar! – Exclamei. – E para além disso achas que a alcateia toda não vai saber disto? E tu vais continuar a sofrer por causa dela e eu por causa do Sam até encontrar-mos alguém! E se não encontrar-mos a nossa impressão aqui?
- Acalma-te. Vamos os dois conhecer alguém. Não te preocupes. E a alcateia fica calada se pedir-mos. – Ele afastou-se e voltou a desviar o olhar do meu corpo. – Até lá isto nunca aconteceu.
- Pois. Nunca aconteceu…